Comentários Lição 04 - Senhor das nações (Amós e Obadias) - CPB

20 a 27 de Abril de 2013

Luiz Gustavo S. Assis é formado em teologia pelo Unasp Campus 2 e atualmente exerce a função de pastor distrital no bairro Sarandi, na Zona Norte de Porto Alegre, RS.


 Introdução:
Diariamente, somos expostos a injustiças e desigualdade social. Enquanto alguns têm muito, outros têm bem pouco. Esse não é um problema exclusivo do século 21. Na verdade, avareza e egoísmo são algumas das raízes do pecado. Há pouco mais de dois anos, a BBC de Londres fez uma pesquisa com um grupo expressivo de pessoas com a seguinte pergunta: Qual é o maior problema do mundo atual? Pela primeira vez a resposta foi corrupção. Ora, essa resposta não deveria nos deixar surpresos, já que isso é evidenciado todos os dias, na TV, na internet ou nas ruas.

Amós surge num contexto semelhante a esse no reino de Israel. A responsabilidade do povo escolhido de Deus não era apenas a de exercer uma influência espiritual positiva para as nações ao redor. Vivendo essa verdade, eles deveriam proporcionar uma economia em que todos fossem beneficiados, não apenas alguns. O interessante no livro de Amós é que Deus também tinha muito a falar sobre os pecados das outras nações. Em outras palavras, Ele não estava olhando apenas para Israel e Judá, mas para todas as nações, e tinha uma sentença para todas elas.


Algumas assustadoras estatísticas sobre a pobreza no mundo e qual deveria ser a postura cristã podem ser vistas na obra de Craig Blomberg, “Nem Riqueza, Nem Pobreza: Uma teologia bíblica das finanças” (Esperança, 2009), p. 17-20.



 Ampliação: 

I. Conhecendo o livro

    Graças aos estudos cronológicos do erudito adventista Edwin Thiele, podemos estabelecer com segurança as datas dos reinados dos reis de Israel e Judá. Seus estudos doutorais na Universidade de Chicago nos anos 1960, foram uma das maiores contribuições adventistas no meio acadêmico envolvendo o Antigo Testamento. Por causa disso, não restam muitas dúvidas sobre os períodos de governo dos monarcas mencionados na Bíblia. Amós menciona que o ministério dele ocorreu durante o reinado dos reis Uzias, em Judá, e Jeroboão II, em Israel, e que foi dois anos antes do terremoto (Am 1:1). Existem diversos indícios arqueológicos em Hazor, em território israelita, de que houve um severo terremoto na região na metade do oitavo século, por volta do ano 760 a.C. Esse foi justamente o período do governo desses dois reis.

    Esse foi um período privilegiado tanto para Judá como para Israel. Os grandes inimigos desses reinos (Babilônia, Egito e Assíria) estavam enfraquecidos e isso trouxe prosperidade para os israelitas. Nem toda a nação desfrutou dessa abundância. Amós denunciou as extravagâncias dos ricos falando das casas adornadas com marfim (3:15), das camas de marfim (6:4), o que pode ser comprovado graças às escavações arqueológicas feitas em Samaria. Enquanto alguns se deliciavam em suas mansões, os necessitados da nação (órfãos e viúvas) careciam do essencial para a subsistência. Interessante que, em menos de trinta anos, essa tranquilidade e paz foi trocada pela destruição causada pelos assírios em 722 a.C. Foi nesse contexto que Deus chamou Amós para ser Seu mensageiro.


    Apesar de ser identificado como um dos “pastores” da cidade de Tecoa (v. 1), suas habilidades retóricas e seu amplo conhecimento sugerem que Amós não era um simples camponês como alguns pensam. Há uma possibilidade de que o termo hebraico para ‘pastor’ nessa passagem (noqed) signifique alguém que administrava a um grupo de pessoas que cuidavam de rebanhos. A informação de que ele não era “profeta, nem filho de profeta” (7:14, 15), significa que ele não era um profeta “profissional” que fizesse disso sua principal atividade. Ele não falava aos reis o que eles gostariam de ouvir, como é sugerido no contexto do capítulo 7.


    A cidade de Tecoa ficava aproximadamente a 11 km ao sul de Jerusalém. Suas ruínas são conhecidas como Tekua. Apesar da proximidade com a capital do reino do Sul, o ministério de Amós tinha primariamente o reino de Israel como alvo. Podemos pensar que nosso local de nascimento, bairro ou rua em que moramos tenha pouca importância para Deus. Apesar de Tecoa não ser uma das principais cidades da Bíblia, Amós foi convocado pelo Senhor para sair de lá e dar Sua mensagem diante de um rei e outras pessoas importantes.

    II. A mensagem do profeta Amós

    A seguir, você pode conferir uma estrutura básica da obra de Amós:


    a) Introdução (1:1, 2)
    b) Julgamento sobre as nações (1:3–2:16)
    c) Julgamento sobre o povo de Deus (3:1–5:17)
    d) Anúncios do exílio (5:18–6:14)
    e) Visões de Amós (7:1–9:10)
    f) Restaurada a visão de Israel para o futuro (9:11-15)



    Ao longo dos seus nove temas, dois se destacam na obra de Amós: justiça social e julgamento. Todas as lições sobre Amós nessa semana estão relacionadas com esses dois assuntos.

    Justiça social: Podemos listar alguns dos pecados da nação israelita: opressão contra os pobres (2:6-7a; 5:12; 8:4, 6), injustiça  nas cortes (2:7a; 5:7, 12; 6:12), imoralidade sexual (2:7b), abusos religiosos (2:8); violência (3:10), idolatria (5:26); negociações corruptas (8:5).  Muito além da preocupação meramente espiritual e religiosa, o Deus revelado nas páginas do livro de Amós parece estar preocupado com o que fazemos no nosso dia a dia, não meramente na nossa esfera espiritual. De fato, fé verdadeira se manifesta em ações, especialmente aquelas relacionadas à justiça social.

    É interessante notarmos que Deus também estava atento aos crimes e pecados envolvendo a justiça social nas nações vizinhas. Como pode ser visto nos dois primeiros capítulos do livro, o que acontecia em Damasco, Gaza, Tiro, Edom, Amon e Moabe estava sendo registrado pelo Senhor. Ele não estava ignorando nem mesmo as angústias daqueles que não pertenciam ao Seu povo escolhido. Esse, quem sabe, seja um dos mais belos insights do cuidado que Deus tem com todas as Suas criaturas ao redor do mundo. Ele Se preocupa com as injustiças do Brasil, mas também com as que ocorrem em Bangladesh ou na Bélgica, realidades bem distantes das nossas.


    Julgamento: Se Deus apenas soubesse o que estava acontecendo em todas as nações, mas não agisse, ou Ele seria incapaz de fazer algo ou desinteressado em executar justiça. No entanto, através do punho do profeta, lemos quais seriam as intenções divinas em relação aos seus crimes e pecados. No caso de Israel, por exemplo, eles seriam punidos pela injustiça e exploração do pobre (2:13-16; 6:8, 14; 8:9–9:10) e aqueles que viviam de maneira pomposa à custa de outros perderiam tudo o que possuíam (3:15–4:3; 5:16, 17; 6:4-7). Muito interessante é notar que Amós utilizou algumas palavras que serviam como código e seus ouvintes e leitores as compreenderam automaticamente. Por exemplo, em 4:1 ele chama as mulheres de vacas de “Basã”. Podemos pensar que se tratasse de uma ofensa, mas na verdade era uma perfeita descrição da realidade. Basã era conhecida por ter o melhor gado de todo o território de Canaã. No caso das mulheres de Israel, toda a riqueza e o dispendioso estilo de vida era mantido com exploração dos pobres. Por causa disso, Deus iria expor a hipocrisia e a falsa piedade do Seu povo (4:4-5; 5:21-23).

    Mas Deus desejava chamá-los de volta para Si. Uma das narrativas mais dramáticas que Deus utilizou para atrair Israel para Seus caminhos pode ser lida em 4:6-12. Ali podemos ver todo tipo de tragédia, problemas climáticos, pragas semelhantes às do Egito, fome, entre outras terríveis situações. Todos esses desastres estavam relacionados à desobediência aos mandamentos (cf. Lv 26; Dt 28). Por cinco vezes, uma frase é repetida quase que num tom fúnebre: “contudo, não vos convertestes a mim, disse o Senhor” (v. 6, 8, 9, 10, 11).
    A intenção divina foi frustrada. Por isso, a tônica do verso 12 seria o próximo passo: “Prepara-te, ó Israel, para te encontrares com o teu Deus”. Mesmo diante de uma condenação anunciada, o profeta ainda advertiu o povo a mudar de rumo: “Buscai ao Senhor e vivei” (5:6).

    Já mencionamos como isso aconteceu em Israel. Em 722 a.C., os assírios o destruíram. E quanto aos povos que tiveram seus crimes e pecados denunciados? A condenação também foi executada. Praticamente todas aquelas nações de alguma forma foram afetadas pelas campanhas de Nabucodonosor, rei de Babilônia, na mesma época em que ele estava conquistando o reino de Judá e levando diversos moradores como exilados. Os filisteus, por exemplo, foram destruídos nessa ocasião.


    O livro de Amós termina com uma nota de esperança. Após esse julgamento, Deus restauraria Seu povo (9:11-15).



    II. A relevância da mensagem do profeta Amós

    Quero demonstrar a relevância das mensagens de Amós para nossos dias.

    Ponto cego: Aqueles que dirigem sabem muito bem que, em determinadas ultrapassagens, somos traídos pelo nosso ponto cego. Nenhum dos espelhos retrovisores conseguem mostrar um carro na nossa lateral. Por isso a necessidade de se olhar para o lado, não somente para os espelhos. Imagino que com Israel e Judá não tenha sido diferente. Note bem: Amós começou seu livro falando contra os vilões de Israel. Amom, Moabe, Edom, Filistia e Síria. Os moradores de Israel devem ter se alegrado ao ouvir as duras mensagens de Deus para os arrogantes líderes dessas nações. O que eles não esperavam era uma mensagem contra eles mesmos!  Nosso coração é enganoso (Jr 17:9) e por isso temos nossos pontos cegos. Uma das coisas mais difícies é lidar com nossos erros e fracassos. Por isso, é muito mais fácil esquecer um elogio do que uma crítica. Precisamos ser honestos com nós mesmos e admitir que nem sempre podemos estar certos e, se necessário, retratar-nos. 

    “Busquem o Senhor”: O verbo hebraico para buscar é darash e carrega em si a ideia de uma busca constante. Podemos imaginar que nossa presença nos cultos da igreja seja sinônimo de buscar a Deus. No entanto, é necessário algo maior do que isso. É relacionar-se com o Senhor através de uma leitura atenta da Sua palavra. É orar com um desejo de ter a mente transformada pela atuação poderosa do Espírito Santo. Nas palavras do pregador britânico Charles Spurgeon: “orar é subir com asas de águia acima das nuvens e chegar ao céu claro, habitado por Deus. É entrar na casa do tesouro do Senhor e fartar-se de uma fonte inesgotável”. Como tem sido sua vida de oração e de estudo da Bíblia? Superficial ou profunda?

    Justiça social: Há alguns anos minha esposa e eu tivemos a oportunidade de visitar uma pequena cidade no sul da França chamada Le Chambon-Sur-Lignon. O que aconteceu lá foi algo extraordinário. Essa cidade era o refúgio mais seguro para os judeus durante a 2ª Guerra Mundial. Durante o período de ocupação nazista, o pastor local, André Trocmé, liderou uma resistência não violenta entre seus fiéis. Como resultado, mais de três mil judeus foram salvos graças à liderança de alguém que se recusava a negar suas crenças mesmo diante de soldados armados da Gestapo e da SS alemã. No topo da porta de sua congregação, pode ser lida uma máxima cristã em francês: “Aimez-Vous Les Uns Les Autres”, isto é, “Amai-vos uns aos outros”. E foi nessa congregação que Trocmé inflamou seus ouvintes com um sermão intitulado “As Armas do Espírito”, em que desafiou cada um deles a viver as palavras de Jesus. Esse mesmo espírito era difundido por meio dos dezessete pequenos grupos de estudos da Bíblia que havia em sua congregação. Como disse a mãe de três crianças judias salvas pelos esforços do Pr. André Trocmé: “Se o holocausto nazista foi uma tempestade, Le-Chambon-Sur-Lignon foi o arco-íris”. A simplicidade e coragem dessa atitude é reconhecida até hoje entre os milhares de judeus ao redor do mundo. Pense nisto: a atitude de um homem em uma pequena cidade foi reconhecida e será sempre lembrada por toda uma nação.

    Hoje, não estamos numa guerra como Trocmé estava, mas podemos fazer algo por aqueles que vêm até a porta da nossa igreja ou da nossa casa pedindo algo para comer ou vestir. Será que não somos capazes de organizar juntamente com nossa unidade da Escola Sabatina a visita a um orfanato ou asilo e levar um pouco de alegria e esperança para aqueles que tanto necessitam? Creio que sim, afinal, o amor cristão se demonstra também através de atos.


    Obadias

    Quero compartilhar alguns rápidos comentários sobre o livro do profeta Obadias. Trata-se do menor livro do Antigo Testamento, mas com algumas lições que podemos aplicar à nossa vida. Não sabemos nada sobre seu autor, além do seu nome. Obadias significa “servo do Senhor”. Pelos versos 11-14, alguns acadêmicos sugerem que o livro tenha sido escrito na época da destruição de Jerusalém, em 586 a.C., ou um pouco depois disso. Como pode ser visto nos 21 versos do livro, a mensagem é direcionada ao território de Edom, cujos habitantes se alegraram no dia da destruição do povo de Judá (v. 12) e se envolveram diretamente na sua destruição. Existem algumas lições a ser aprendidas aqui:


    1ª) A justiça de Deus tarda mas não falha: Edom teve sua participação na destruição de Jerusalém em 586 a.C. Apesar de uma aparente demora da justiça divina, esta pode ser vista em 553 a.C., quando o rei babilônico Nabonido destruiu o reino dos edomitas. Esse fato deve nos alertar quando pensamos que Deus deixa impunes aqueles que trazem dor e sofrimento à vida dos Seus filhos. Justiça postergada não é justiça esquecida.


    2ª) Schadenfreud: Essa é uma palavra alemã sem tradução para o português, cujo sentido é sentir-se feliz com a desgraça de outra pessoa. Diversos estudos neurológicos já foram feitos demonstrando como o cerébro reage diante dos infortúnios de outras pessoas. Enquanto a inveja é você desejar algo de outra pessoa, schadenfreud é se alegrar quando algo terrível acontece com ela. Os edomitas sofriam desse mal chamado schadenfreud, pois eles se alegraram diante da tragédia que veio sobre Jerusalém. Deus os repreendeu por isso. A grande realidade é que estamos sujeitos a esse mesmo sentimento hoje. No fundo, é difícil encontrar alguém que nunca disse:

    “Bem feito!” após algo ruim acontecer com alguém. O Deus que reprovou os edomitas é o mesmo que desaprova esse tipo de sentimento.

    Apesar de pequeno, o livro de Obadias pode ajudar você e sua unidade da Escola Sabatina a viver bem consigo mesmo e com os demais ao seu redor.



Algumas assustadoras estatísticas sobre a pobreza no mundo e qual deveria ser a postura cristã podem ser vistas na obra de Craig Blomberg, “Nem Riqueza, Nem Pobreza: Uma teologia bíblica das finanças” (Esperança, 2009), p. 17-20.
Edwin R. Thiele, “The Mysterious Numbers of the Hebrew Kings” (Eerdmans, 1965)
Os arqueólogos responsáveis pelas escavações em Samaria foram: G. Reisner, C. S. Fisher e D. H. Lyon, em 1908 e 1910. Posteriormente, J. W. Crowfoot, Kathleen Kenyon e outro em 1931–1935. Restos dos palácios dos reis Omri e Acabe foram encontrados durante esse período de escavações.
Um registro cuidadoso de tudo o que aconteceu em Le Chambon pode ser lido em Philip Hallie, “Lest Innocent Blood Be Shed: The Story of the Village of Le Chambon and How Goodness Happened There” (Harper Perennial, 1994).



Vídeos

Introdução - Esboço da Lição “Busque ao Senhor e Viva” (aqui).
Esboço da Lição 4 - Senhor das nações (Amós e Obadias) (aqui).

Fonte: CPB

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