Comentários Lição 03 - Sacrifício (Prof. César Pagani)

12 A 19 de outubro de 2013

Verso para Memorizar

“Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.” (Rm 12:1)

César L. Pagani
            Pelo sistema sacrificial aplicado no santuário, o povo vinha apresentar-se perante Deus com ofertas. Podiam ser ofertas queimadas ou holocaustos, ofertas e manjares, ofertas pacíficas, ofertas pelo pecado, ofertas pelos pecados e culpas e os sacrifícios contínuos. Cada oferta tinha seu propósito e ensinos preciosos.
            “Em tais condições, no ministério do tabernáculo e do templo que mais tarde tomou o seu lugar, ensinavam-se ao povo cada dia as grandes verdades relativas à morte e ministério de Cristo, e uma vez ao ano suas mentes eram transportadas para os acontecimentos finais do grande conflito entre Cristo e Satanás, e para a final purificação do Universo, de pecado e pecadores.Patriarcas e Profetas, 358.
            Um pouco de etimologia da palavra sacrifício: Procedente do latim sacrificium, termo composto de sacer e ficium. Termo ligado ao contexto das antigas celebrações ritualísticas da cultura indo-europeia, com sentido de ‘ato de fazer/manifestar o sagrado’- ou seja, o ‘ato de passar da esfera do profano para a esfera do sagrado’. Na língua portuguesa a palavra tem o sentido de ‘privação’ voluntária ou forçada, de um bem ou de um direito’. Este significado constitui uma redução do campo semântico original do vocábulo referido, de que se manteve apenas a referência à prática, nos ritos, de oferecer-se um bem a uma divindade, com vistas à obtenção de alguma dádiva. 

DOMINGO
 O primeiro sacrifício       
             Falamos em primeiro sacrifício típico, porquanto, de fato, o primeiro e definitivo sacrifício foi feito nos tempos imemoriais da eternidade tendo como altar o coração do próprio Criador. Ali Cristo já havia morrido para salvar os únicos seres no Universo que se rebelariam contra seu Soberano. O Cordeiro foi morto muito antes da fundação do mundo.
            No dia da transgressão a visita de Deus foi revestida de grave solenidade. A primeira pergunta do Senhor ao homem foi: “Onde estás?” Um sentimento muito estranho, nunca antes experimentado pelo homem, se apossou de Adão. A presença de Deus causava-lhe um temor inaudito. Talvez certo receio de ser consumido vivo diante da santidade de Deus perpassou o coração de Adão.  E não sem razão. Deus é fogo consumidor para o pecado. Ele o destrói, consome, elimina. Quem estiver apegado à transgressão perecerá junto com ela.
            Lembremo-nos de que Deus dissera ao casal ainda em estado de santidade perfeita: “No dia em que dela comeres, certamente morrerás.” (Gn 2:17) Essas duas palavras “no dia” seriam mera força de expressão da parte de Deus? Ora, Adão transgredira juntamente com sua mulher e ambos não morreram. Aliás, Adão viveu nove séculos e uns tantos anos depois de haver pecado. Por que Deus não cumpriu Sua palavra? Ele cumpriu, sim. É que um substituto fora sacrificado no momento da transgressão. Esse substituto já depusera Sua vida. O fizera de direito muito antes até da criação do mundo. De fato, depois de 4.000 anos do pecado Ele consumaria o sacrifício substituto sobre o Monte Calvário. Eis a razão de Adão e Eva não terem morrido na hora.
            O substituto descenderia da mulher e seria tão poderoso que esmagaria, por Seu sacrifício, a cabeça de Satanás. A afirmação do verso 15 de Gn 3 expressa claramente que Satanás seria morto no futuro por causa do que o Descendente da mulher realizaria.
            Depois de pronunciar a sentença sobre a serpente e o casal, Deus iria Se retirar para Sua habitação no Céu. Antes disso, porém, providenciou vestes substitutas para a cobertura de luz que antes envolvia os corpos de Adão e Eva. Peles de animais – dada a estatura do primeiro casal, muitos animais foram sacrificados para prover-lhes vestuário – foram preparadas pelo Senhor para agasalhar os pecadores. O primeiro derramamento de sangue substituto fora feito. O casal vivia agora abrigado pelo que antes havia sido a cobertura dos animais.
            Eles continuariam a viver por longo tempo e ao lavar as vestes e trajá-las, lembrar-se-iam de que alguém havia morrido para que eles fossem beneficiados.

SEGUNDA
                As ofertas variadas requeridas dos israelitas mantinham-nos constantemente relacionados com o templo, onde se manifestava a presença de Jeová. O texto da lição de hoje explica bem os tipos de ofertas que se faziam no tabernáculo.
            Há muitas instruções para o sacrifício ao longo do Pentateuco, mas em Levítico são dedicados completamente os capítulos 1-7 às cinco ofertas que eram os principais sacrifícios usados nos rituais:  Holocausto, Oferta de Manjares, Oferta Pacífica, Oferta pelo Pecado e a Oferta pela Culpa. Cada um dos sacrifícios foi cumprido exclusivamente em Jesus.
 Holocausto - O holocausto era um sacrifício que deveria ser totalmente queimado, consumido. Nada dele era comido, como ocorria em outros tipos de ofertas. Os sacrifícios contínuos eram dessa categoria. O adorador israelita trazia um animal macho (touro, cordeiro, cabra, pombo, ou rola, dependendo das posses do ofertante) até à porta do santuário. O animal devia ser sem defeito. O adorador então colocava as mãos dele na cabeça do animal tendo consciência que a vitima oferecida estava pagando pelas culpas do transgressor. Essa oferta era uma súplica sincera por perdão e aceitação da parte de Deus. O ofertante matava o animal e os sacerdotes procediam ao restante do rito. Os sacerdotes eram responsáveis por lavar as várias partes do animal antes de colocar sobre o altar.
A oferta queimada era realizada para reconciliação dos pecados do povo contra o Senhor, que os separavam de Deus, e era uma oferta de dedicação contínua de suas vidas ao Senhor. 
Oferta de manjares - Os israelitas apresentavam manjares (cereais) ou legumes além dos animais. Em Levítico, cap. 2, há menção de quatro tipos de ofertas de cereal e como cada uma deveria ser preparada.  O pecador poderia oferecer massa de farinha de trigo assada em forno, cozida em forma, frita em panela ou amassada para fazer pão. Todas as ofertas de manjares eram feitas com óleo e sal e nenhum mel e fermento poderiam ser usados. O adorador também traria uma porção de incenso (puro incenso).  As ofertas de manjares eram trazidas a um dos sacerdotes, que a levariam isto até o altar de holocausto e lançariam nele uma "porção memorial", juntamente com o incenso. O sacerdote comia o restante, a menos que ele mesmo estivesse trazendo a comida como oferta.  O propósito da oferta de manjares era um oferecimento de presentes, e expressão de uma vida dedicada a dar.
 Ofertas pacíficas - As ofertas pacíficas eram um manjar dado pelo Senhor aos sacerdotes, e às vezes ao cidadão comum. O adorador trazia bois ou vacas, ovelhas ou uma cabra. O ritual foi comparado ao das ofertas queimadas. Eram consumidas a gordura e as entranhas; o restante era comido pelos sacerdotes e, se fosse uma oferta espontânea, pelos adoradores. Esse sacrifício de louvor e ação de graças era quase sempre um ato voluntário.
Jacó e Labão deram suas ofertas pacíficas quando fizeram um pacto entre si (Gn 31:43 e ss). Essas ofertas eram requeridas quando se faziam votos de consagração a Deus.
Ofertas pelo pecado - As ofertas pelo pecado expiavam, isto é, liquidavam a dívida por completo, no que tangesse às fraquezas e fracassos não intencionais dos adoradores e falhas diante do Senhor. Cada classe de pessoas tinha várias ordenanças a executar: 
Os pecados do sumo sacerdote requeriam o oferecimento de um touro, e o sangue não era vertido no altar, mas aspergido sete vezes pelo dedo do sumo sacerdote sobre o altar. Então a gordura era queimada e o restante incinerado – jamais comido - fora do arraial "num lugar limpo" onde o sacrifício era feito e as cinzas despejadas. Os pecados dos líderes requeriam o oferecimento de um bode. O sangue era aspergido somente uma vez, e o restante vertido ao redor do altar.  Os pecados do povo requeriam animais fêmeas, cabras, cordeiros, rolas, ou pombas e, no caso do ofertante ser muito pobre, uma oferta de grãos era aceitável como um oferecimento de manjares. Os pecados não intencionais eram difíceis de identificar e poderiam acontecer a qualquer hora. Então os sacerdotes trabalhavam como mediadores com Deus e o povo, e instruíam as pessoas sobre como buscar ao Senhor. No caso de qualquer pecado cuja oferta não foi trazida diante do Senhor, havia ofertas para a nação e para o sumo sacerdote que os cobriam de um modo coletivo. No Dia da Expiação (Yom Kippur) o sumo sacerdote aspergia o sangue no propiciatório por seus próprios pecados e pelos pecados da nação. 

Ofertas pela culpa - A oferta pela culpa era bem parecida com a oferta pelo pecado, mas a diferença principal era que a primeira se fazia em dinheiro pelos pecados de ignorância relacionados a fraudes. Por exemplo, se alguém enganasse sem querer a outro por dinheiro ou propriedade, o sacrifício dele devia era ser igual à quantia levada, mais um quinto para o sacerdote e para o ofendido. Então ele reembolsou a quantia apropriada com o acréscimo de 40%.

TERÇA

            Esse capítulo parece ter lances de crueldade da parte de Deus. Assim pode ser para alguém que desconheça o Deus dos deuses. Por que essa prova, visto que Abraão já esperara 25 anos por um filho que Deus prometera; já tivera que apartar-se de Ismael a quem amava; já saíra de sua terra, onde tinha todos os confortos da vida numa das mais prósperas cidades da época, para andar errante, sem saber aonde ia? Que mais queria Deus desse homem, agora com cerca de 125 anos de idade?
            Abraão era um homem plenamente consagrado a Deus, de firme fé e inabaláveis convicções. Ele conhecia bem a Deus.
            Nesse episódio, Deus não pôs à prova somente a Abraão. Ele provou o Universo. Mostrou a todos o que faria com Seu próprio Filho para prover salvação à humanidade perdida. Sem dúvida alguma os seres de outros mundos observaram com profundo interesse aquele homem encanecido viajar três dias sob intensa tortura mental e angústia indizível.
            O verso 8 do capítulo em estudo mostra que Abraão estava confiante de que Deus faria alguma coisa; que Ele interviria sobrenaturalmente levando tudo a um final feliz. Abraão sabia que, ainda que Isaque fosse sacrificado, Deus poderia ressuscitá-lo porque nunca mentiu e não falharia em cumprir o quanto prometera ao patriarca.  Disse a seus servos: “Esperai aqui, com o jumento; eu e o rapaz iremos até lá e, havendo adorado, voltaremos para junto de vós.” “Nós voltaremos” e não “eu voltarei”. Que fé!
            Notemos que Abraão nem mesmo orou para que Deus mudasse Sua ordem. A despeito da tortura interior, não ousou questionar.
            Parece-nos que, não obstante a carga psíquica e emocional que oprimia seu ser, Abraão portou-se com extrema calma. Seus movimentos parecem respirar absoluto controle sobre si mesmo, o que somente pode ser conseguido quando o Espírito Santo governa a vida.
            Conhecemos o desfecho da história. Abraão encontrou um carneiro – que não estava lá quando chegaram e nem apareceu durante os preparativos para o sacrifício – e esse animal inocente foi oferecido em sacrifício de holocausto a Jeová. A quem esse carneiro representava? Não é difícil responder.
            O amor infinito exigiu de Deus que Ele oferecesse Seu Filho Unigênito em substituição à humanidade rebelada e decaída. O Senhor, de fato, proveu para Si o Cordeiro. Naquele mesmo momento o Cordeiro de Deus já estava morto, pois fora sacrificado nas profundas eras eternas. Mais 1.900 anos e a oferta se concretizaria no Monte Calvário. Deus ofereceria Seu Filho em sacrifício. Ninguém poderá jamais avaliar a dor que transpassou o coração do Pai ao ver Cristo carregando os pecados do mundo e sendo morto como culpado transgressor da Lei.
            Muitos acham que por ser Ele o Deus infinito, está isento de sofrimento, de dor, de pesar. Fosse assim e Abraão teria vantagens sobre o Senhor, porque sofreu uma dor a que o próprio Eterno estaria imune.  Por causa de Sua tremenda santidade, o Senhor sofre muito mais do que nós. O pecado Lhe é intolerável. Ele é tão puro de olhos que não pode ver o mal. Contudo, por amor da humanidade, é obrigado a contemplar os abomináveis pecados dos homens. Diz EGW que Jesus, quando aqui na Terra, sofria tortura de espírito por ter de contemplar o mal.  

QUARTA
Vida por vida
            “Também, qualquer homem da casa de Israel, ou dos estrangeiros que peregrinam entre eles, que comer algum sangue, contra aquela alma porei o Meu rosto, e a extirparei do seu povo.  Porque a vida da carne está no sangue; pelo que vo-lo tenho dado sobre o altar, para fazer expiação pelas vossas almas; porquanto é o sangue que faz expiação, em virtude da vida.”  (Lv 17:10, 11)
            Em sete lugares no Pentateuco é repetida a proibição de comer sangue. Deus arrazoa que a vida está no fluxo sanguíneo que perpassa o corpo de homens e animais. Prive-se de sangue qualquer órgão (isquemia) e este se deteriora.
            Quando um animal morre, seu corpo logo entre em processo de decomposição para integrar-se ao solo. A decomposição parcial das proteínas nos cadáveres produz, entre outros compostos, cadaverina e putrescina, substâncias tóxicas presentes em altas concentrações no sangue de animais mortos.  Essa pode ser uma das razões do interdito divino. Por certo haverá outras.
            Entre os cananeus havia nações que, ao prestar culto aos seus deuses, ingeriam a carne com sangue. Os sabeus, por exemplo, eram adoradores do exército dos céus e estavam acostumados a derramar o sangue do animal e comer uma parte da carne no lugar onde o sangue era derramado, crendo que por meio dele amizade, fraternidade e familiaridade seriam concretizadas entre eles e suas divindades.Eles, além disso, supunham que o sangue era muito benéfico para a obtenção de uma visão do demônio durante seu sono, e uma revelação de eventos futuros. A proibição divina de comer sangue parece ter identificação com práticas idolátricas (ver Ez 33:25; 1Co 10:20, 21)
            Paulo Moreira, meu saudoso e emérito professor de Bíblia, costumava provar o fato de a vida estar no sangue com a seguinte argumentação: Se você pegar um garrote – antigo elemento de borracha para deter a circulação do braço enquanto se injetava medicamentos na veia – e deixá-lo por muito tempo no local, o braço vai arroxear, perder sensibilidade e começar a se putrefazer. Assim, o sangue é a vida.
            No sistema sacrificial do AT o sangue do animal portava simbolicamente os pecados do ofertante para o santuário. Ele era a prova de que alguém pagara para que o pecador se mantivesse vivo. Davis afirma: “A perda da vida é o castigo do pecado e o derramamento do sangue é o sinal típico de sua expiação, porque sem efusão de sangue não há remissão (Hb 9:22... O sangue de Cristo, o sangue de Jesus, o sangue de Jesus Cristo  ou o sangue do Cordeiro são expressões figurativas de Sua morte expiatória...”                                               

Sacrifícios hoje: o sacrifício vivo
             “Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos como um sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.   E não vos conformeis a este mundo, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus.” (Rm 12:1, 2)
            O apelo de Paulo nesses versos é patético, como se partisse de suas mais profundas entranhas. Roga ele que os cristãos façam a oferenda que Deus mais espera: seus corpos e mentes.
            Vivo, santo e agradável – O que isso significa? A palavra grega originária para “vivo” é  ζῶσυν ou zōsun. Isso quer dizer que os crentes deveriam dedicar os poderes, forças, energias de seus corpos e mentes ao serviço de Deus. No serviço ritual a vítima era oferecida, morta e apresentada sem vida no altar. Ela não poderia ser novamente apresentada. Era uma só vez. No conselho de Paulo, na oferta de si mesmo a Deus o crente deve fazê-lo em seu melhor estado de saúde física e mental. Daí termos os melhores conselhos de saúde do mundo a nosso dispor. A reforma de saúde preconizada pela IASD é o melhor caminho para cumprir o quanto requerido nesse conselho paulino.
Um sacrifício santo significa sem mancha ou defeito. Deus não aceita sacrifícios espirituais defeituosos. Os judeus eram expressamente proibidos de oferecer um animal coxo, cego ou deformado, porque representava a Cristo, o Cordeiro imaculado.
De maneira semelhante, devemos consagrar a Deus nossas melhores faculdades, o vigor mais pujante de nossa mente, de nossos talentos e o melhor de nosso tempo. Foi assim que Jesus Se consagrou ao Pai. Esse era o culto racional de nosso Salvador.

O Dr. Adam Clarke comentou: “Nada pode ser mais consistente com a razão do que a criatura de Deus glorificar seu Autor. Não somos de nós mesmo; somos propriedade do Senhor, pelo direito de criação e de redenção. Seria irrazoável e seria também mau não viver para Sua glória, em estrita obediência à Sua vontade. O culto racional do apóstolo pode referir-se à diferença entre o culto judaico e o culto cristão. O culto religioso anterior consistia principalmente de sacrifícios de criaturas irracionais, isto é, cordeiros, carneiros, cabritos, touros, bodes, etc., oferecidos segundo a lei mosaica. O culto ou adoração cristã é racional porque realizado de acordo com a intenção e o significado verdadeiro da lei. O coração e a alma estão envolvidos no culto. O pecador vive a vida de um tolo ou de um louco quando vai de encontro a Deus, pois, pecando contra seu Criador ele trata injustamente sua própria alma, ama a morte e recompensa com o mal a si mesmo.” 
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